Há dias, tive de preencher um formulário à mão e deparei-me com uma triste realidade: já não sei escrever. A dificuldade com que pari meia dúzia de palavras e assinei o meu nome é vergonhosa. Estaremos demasiado formatados para o smartphone, tablet e computador? Estará a caneta, efectivamente, a extinguir-se? Ou seremos apenas uns calões comodistas?
Sempre adorei escrever. Em miúda, era raro o dia em que não chegava a casa com a mão cagada de tinta ou grafite. Sou canhota e, como tal, além de redigir, puxava lustro às composições com a lateral da mão, estranha e confortavelmente repousada no caderno pautado, argolado à esquerda, claro.
Sentada no inevitável lado esquerdo da secretária, para não haver cotoveladas desnecessárias, ali estava a menina que escrevia, escrevia, escrevia. Na faculdade, lá estava a menina, toda torta, na cadeira de pala montada para destros. Folhas de teste a sair que nem pãezinhos quentes para a menina que escrevia como se não houvesse amanhã.
A puta de uma declaração, com não mais do que cinquenta caracteres de preenchimento, foi mais difícil de concluir do que a corrida de São Silvestre.
Este post foi escrito originalmente num pequeno moleskine, de capa cor de rosa, bem paneleira, enquanto aguardava pelo dentista. Não é o post mais emocionante do mundo mas, pelo menos, é fruto de um esforço sincero de contrariedade à invalidez que tentou chegar às minhas mãos. Borrão de tinta na mão esquerda: orgulhosamente conseguido. Tau.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.